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Título: A CASA DOS IMPOSSÍVEIS
Autor: José Eduardo Degrazia
Capa: Elizethe Borghetti

ISBN 978-85-94187-18-5

Dimensões: 14 x 21 cm
Páginas: 166
Gênero: Teatro
Ano: 2018
 

A situação enfocada por Degrazia desenvolve contexto um pouco diferente: dois personagens, um homem e um velho, depois de assaltarem a um banco, escondem-se em uma casa abandonada nos arredores de uma cidade e dela se tornam prisioneiros. Para Degrazia, claramente, não há um dominador e um dominado constantes. As rubricas da peça são claras: a cada cena, o jovem ou o velho vestem um roupão vermelho, uma espécie de símbolo do poder de que usufruem, humilhando o outro. Mas nenhum deles, embora querendo, consegue deixar a casa. O texto pode ser lido tanto enquanto uma crítica ao papel das gerações quanto, na perspectiva metafórica, ser pensado como a ditadura
brasileira (alusão indireta ao slogan “Brasil, ame-o ou deixe-o”, que circulou no pior período da violência do regime ditatorial, o período de Emílio Garrastazu Médici.
Os demais textos, a que o autor denomina alternativamente de farsas, comédias ou quadros, focam sua atenção em situações variadas e cujos títulos quase sempre explicitam O maior e, por isso, principal texto que o leitor aqui encontrará chama-se “A casa dos impossíveis”. Já no título, a ironia, talvez, hoje, dolorida. A situação reflete, de certo modo, um contexto que já havia sido desenvolvido pelo filósofo existencialista Jean-Paul Sartre, em “Huis clos” (“Entre quatro paredes”, em português), do mesmo modo que pelo dramaturgo irlandês Samuel Beckett, em “Endgame/Fin de partie”, conforme a versão inglesa ou francesa (“Fim de partida”, em português) ou, mais recentemente, e em nossa própria província, por Ronald Radde, em “B... em cadeira de rodas”. No caso de Sartre, temos um pós-mortem em que alguns personagens são reunidos, aleatoriamente: cada um teme o olhar do outro, porque este olhar significa uma espécie de julgamento. Um olhar de alguém que implica num juízo de valor contra o qual nada podemos fazer – daí a frase “o inferno são os outros”. O fundo da peça sartreana era filosófico.
No caso de Beckett, o texto, escrito alguns anos depois da tragédia de Hiroschima e Nagazaki, trazia alusões indiretas àquele holocausto.
No caso de Radde, temos também um contexto posterior a uma catástrofe em que um dominador, embora em uma cadeira de rodas, mantém controle sobre um outro personagem que, embora livre, ou aparentemente livre, é-lhe subserviente.
A situação enfocada por Degrazia desenvolve contexto um pouco diferente: dois personagens, um homem e um velho, depois de assaltarem a um banco, escondem-se em uma casa abandonada nos arredores de uma cidade e dela se tornam prisioneiros. Para Degrazia, claramente, não há um dominador e um dominado constantes. As rubricas da peça são claras: a cada cena, o jovem ou o velho vestem um roupão vermelho, uma espécie de símbolo do poder de que usufruem, humilhando o outro. Mas nenhum deles, embora querendo, consegue deixar a casa. O texto pode ser lido tanto enquanto uma crítica ao papel das gerações quanto, na perspectiva metafórica, ser pensado como a ditadura brasileira (alusão indireta ao slogan “Brasil, ame-o ou deixe-o”, que circulou no pior período da violência do regime ditatorial, o período de Emílio Garrastazu Médici.
Os demais textos, a que o autor denomina alternativamente de farsas, comédias ou quadros, focam sua atenção em situações variadas e cujos títulos quase sempre explicitam as intenções: “O Senhor Político e sua Senhora”, a respeito da corrupção dos políticos (a atualidade é triste...); “Escola de assaltantes” parece parodiar Jean-Baptiste Poquelin, o Molière, e sua “Escola de mulheres”, mas fala a respeito da diferença entre o pequeno ladrão de galinhas e o grande ladrão de colarinho branco (continua atual, do mesmo modo); “O editor” é uma brincadeira a respeito da corrupção, agora já ao nível privado, a evidenciar que tal prática não é prerrogativa de uma só categoria social; o mesmo ocorre com “O médico oficial e o médico alternativo”, em que se discute a corrupção no campo da medicina, atividade que, ao invés de ser um apostolado, conforme o juramento de Hipócrates, tornou-se uma prática altamente rentabilizada; “Jornalista sacana e o jornalista sério”: o texto é uma variante do texto anterior, apenas trocando a ocupação e a prática profissional (mas a tendenciosidade se mantém a mesma); “O motorista” serve de pequeno descanso das acusações politizadas para ser apenas um “divertimento” , assim como “Está tudo bem”, em que uma família de classe média alta não alcança entender o porquê de haverem revoltas populares por falta de dinheiro para adquirir alimentos e garantir a sobrevivência das pessoas. Mais que isso, evidencia que a corrupção é uma prática interiorizada e privatizada.
Talvez um dos textos mais risíveis e, ao mesmo tempo, mais oportunos para se entender o que ocorreu com as esquerdas brasileiras seja “O Ministro da Economia e a Velha Patusca”, em que os dois personagens, aparentemente situados em campos opostos, num primeiro momento, acabam encontrando pontos em comum e juntar seus interesses numa atividade articulada. Aliás, não creio ser casual ou aleatório o fato de a coletânea se encerrar com outro texto um pouco mais longo, “A suburbana”. Nesta cena, temos a transformação da jovem casadoira numa espécie de prostituta amadora, mas bem instalada na vida, retrato fiel, infelizmente, de boa parte da classe média nacional.
Em síntese, eis um volume com textos antigos, com quase cinquenta anos de distância entre sua criação e sua publicação. Velhos? Parecem. Mas quando a gente começa a lê-los, eles ganham uma lamentável atualidade. Talvez seja por isso que a gente os lê com um travo na garganta. E talvez seja por isso que José Eduardo Degrazia tenha se decidido a publicá-los. Sim, seria realmente muito bom se eles fossem velhos, como podem parecer. Mas, infelizmente, eles são absolutamente contemporâneos. Infelizmente.