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Título: ADENTRO
Autor: Gustavo Lagranha

ISBN : 978-85-94187-85-7
Formato: 14 x 21 cm.
Páginas: 94
Gênero: Contos
Publicação: Class, 2019

Vem a público o primeiro livro de Gustavo Lagranha, meu amigo e colega da Faculdade de Letras da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e hoje advogado na cidade de Vacaria/RS. Lá por 2006-2007, vivemos uma das melhores fases das nossas vidas como estudantes universitários. Depois das aulas, nos reuníamos para conversar sobre literatura. Líamos Hesse, Salinger e Dostoiévski e sonhávamos um dia causar um impacto tão grande no mundo como esses autores. Na época, o Gustavo já escrevia contos e textos e participava de oficinas literárias. Eu, por minha vez, ainda almejava a carreira de professor de espanhol, de que viria a abrir mão logo em seguida. Lembro que todos víamos com admiração o fato de termos um colega que já escrevia, e o fazia com tanto talento. Em nosso grupo de amigos e colegas, a maioria estava focado na busca por algum estágio na área da docência e, muito embora fossem todos amantes da literatura, era raro ver alguém que se dedicasse ao fazer literário.

         Foi uma época de muito aprendizado em que, principalmente, forjamos um jeito de ver o mundo. Hoje, mais de dez anos depois, ainda lembro com muita saudade e adoração aquelas tardes e noites rodeadas de amigos, discutindo nossas obras literárias favoritas, conversando sobre a arte e os desafios de produzi-la e apreciá-la. Aprendemos sobre a vida como só o período da juventude permite aprender: sem as preocupações dignas da fase adulta. A companhia dos livros e filmes era contínua e sempre reconfortante. Até hoje, pra mim, ler é também voltar um pouco àquele tempo de ouro, sendo a leitura uma das atividades que representavam a liberdade que tínhamos então.

         É este sentimento de desprendimento que a juventude nos brinda que de certa forma permanece em outros períodos, como o que vivemos agora, já no alto dos nossos trinta e poucos anos (ironicamente falando, claro). Olhamos para o que aconteceu há pouco mais de dez anos atrás e parece que foi em outra vida. Não só pelos incessantes avanços tecnológicos, mas pelo que nos tornamos todo esse tempo depois. A lembrança daquela época mágica segue viva e presente, apesar da insistência dos anos em colocar o peso da responsabilidade e da sobriedade em nossa existência.

         Muito se fala das pessoas idosas e sua maturidade inerente, como se cada palavra dita por alguém mais velho viesse com o carimbo da madurez. Mas e quando é o jovem que mostra a maturidade de poucos? Quando a maturidade vem dos ritos de passagem pelos quais essa pessoa conseguiu ultimar e não meramente dos anos que viveu? Como a nossa sociedade reage?

         O livro de contos do Gustavo que estou tendo a felicidade de apresentar nos traz um pouco dessa impressão, tanto em sua subjetividade quanto na força de suas narrativas. Trata-se de uma coletânea de textos escritos inicialmente na época que nos conhecemos e ao longo de mais de uma década depois, em que o autor mostra não apenas o seu talento desde os tempos em que compartilhamos as disciplinas na Faculdade de Letras e éramos - de fato - jovens, mas também deixa evidente a maturidade de quem desde esta primeira publicação revela a habilidade dos grandes escritores. 

Ao longo dos dezenove contos de Adentro, temos uma multiplicidade de vozes: narradores que trazem histórias com um fio condutor entre todas elas - a visão madura e inteligente que só quem viveu a plenitude de sua existência pode ostentar.

É conhecida a história de que o escritor argentino Julio Cortázar tinha certo receio de sua primeira publicação, que inclusive foi lançada com um pseudônimo. Em entrevistas, dizia que era preciso ter certa maturidade para começar a publicar e se irresignava com escritores que diziam ter publicado suas primeiras obras muito jovens e que a certa idade se arrependiam daqueles primeiros escritos.

No caso do presente livro, o que temos é um novo autor com a maturidade dos velhos escritores. Em cada uma das histórias aqui contadas, é possível extrair não apenas um rigor literário digno da pena de contistas mais experientes, mas também uma criatividade exemplar e uma versatilidade rara em transitar pelos diferentes gêneros da narrativa curta.

Atrás de histórias aparentemente simples, como a do personagem Jason em “Conto de cidade pequena” ou Zé no conto homônimo, temos subjetividades que nos convidam à reflexão e a questionamentos sobre a realidade e nossa sociedade. Há espaço, também, para a narrativa policial, como vemos no instigante “Inverno”, onde o detetive porto-alegrense Duque fica no encalço de um praticante de magia negra suspeito de um crime. E, também, temos contos um pouco mais longos de uma primazia singular, com características muito originais, nos quais a literatura ganha contornos próprios da marca do autor, como os belos “Ampulheta”, “O álamo branco” e “Três da casa marrom”

Como se essa passagem de um gênero a outro com naturalidade já não bastasse para caracterizá-lo como um grande contador de histórias, Gustavo ainda nos traz contos curtos em prosa poética, com um estilo de escrita que nos coloca ao borde do sonho e da magia, como em “Praia” e no próprio “Adentro”, que dá nome ao livro.

Diante de uma coletânea de textos desta qualidade, como apreciadores da literatura, nos cabe fruir do volume em mãos sem perder de vista a raridade da situação: as obras que ainda virão pela frente, de alguém que com seu livro de estreia já se apresenta como um escritor traquejado. A pergunta que nos caberá fazer e responder ao acompanhar esta promissora carreira que se inicia é: o que virá depois de tamanha maturidade atingida numa obra de estreia?

Publicar uma obra inaugural da dimensão de Adentro faz com que todos os amantes da literatura posicionem a partir de agora o nome do Gustavo em um lugar de destaque na literatura contemporânea brasileira. Para mim, como amigo e admirador de seu trabalho há mais de uma década, não se trata de nenhuma surpresa. Os planos de causar impacto no mundo continuam, a forma de fazer isso é que mudou: se na juventude líamos e idolatrávamos as obras de outros autores, é chegada a hora de escrevermos os nossos próprios livros. Gustavo deu aqui o primeiro passo firme nessa direção. A literatura agradece.

Lucas Laitano Valente